27/06/2018 09:25:00
Lugar de mulher é onde ela quiser. Foi com essa frase simples, mas cheia de significado, que a professora de Artes Visuais Geane Senra deu voz ao feminismo na Escola Municipal Mozart Lago, localizada em Oswaldo Cruz, na Zona Norte da cidade. Mesmo próprias da juventude, as eventuais abordagens dentro e fora do colégio sinalizaram para a necessidade de discutir o papel da mulher na escola e na sociedade e questionar as
consequências das atitudes de cada um.
O assunto acabou levado à sala de aula das turmas do 7º e do 9º anos depois que a própria professora foi abordada de forma desrespeitosa a caminho da unidade. Durante os debates, o grupo de estudantes surpreendeu com a participação e o empoderamento sobre o tema, mas um aluno inquieto chamou atenção da professora. Allan Fernando da Silva, transferido de outra unidade, não prestava tanta atenção por conta das rimas que gostava de fazer.
Para atrair e inserir o estudante no assunto, Geane o desafiou a criar um funk no improviso sobre o feminismo. O MC "2 LL", como também é conhecido na escola, fez os versos na hora e chamou atenção da professora e dos colegas. A mensagem cantada, que falava que homem que bate em mulher precisa ser denunciado, foi gravada despretensiosamente pela docente. O vídeo, publicado em uma rede social, passou de mais de meio milhão de visualizações, inúmeros compartilhamentos e elogios.
"O sucesso do vídeo foi o que a gente precisava para fortalecer ainda mais o projeto com toda a escola. Os alunos viram o quanto é importante à mulher lutar por respeito, igualdade e ter a sua opinião levada em consideração nas decisões", explicou a professora.
Para Kamilla Victória Rabelo, de 14 anos, a atitude da professora de reunir os alunos para discutir temas considerados tabus foi inédita:
"Ninguém falava sobre isso na escola. Todos merecem respeito, independente de ser menino ou menina", ressalta a estudante.
Os debates também transformaram o conceito dos alunos. É o caso de Leandro das Mercedes, de 16 anos.
"O assédio era algo muito comum no nosso dia a dia. Mas basta a gente se colocar no lugar delas para ver que não é legal. Agora o nosso objetivo é abrir mais a mente das gerações dos nossos pais e avós", relata.
Iniciativa de debates levanta outros temas
Geane está há dois anos na Rede Municipal e antes nunca havia lecionado. Após os debates sobre o feminismo e com um grupo de alunos mais fortalecido e maduro, a professora percebeu que estava no caminho certo. Com aulas atrativas, os alunos ficaram mais motivados e o espaço escolar se tornou mais interessante.
Entre a teoria, a prática e as rodas de debates, a docente inseriu outros assuntos importantes como autoestima, diversidade de gênero, racismo e ocupação urbana. Os dois últimos temas foram apresentados em forma de arte. Os alunos foram apresentados às obras do artista Jean Michel Basquiat, grafiteiro, negro e ativista.
"Discutimos muito sobre o preconceito, estudamos as obras de Basquiat e no final os alunos produziram uma arte inspirada no artista americano no portão de entrada da escola", relembra a professora.
A pintura segue conservada, sem ter sofrido nenhum tipo de vandalismo, algo antes incomum no colégio. A participação ativa dos estudantes contagiou toda a escola e extrapolou os muros da unidade. Com uma direção nova, com apenas seis meses de mandato, a Mozart Lago vem se transformando. O espaço escolar está mais conservado,
os responsáveis estão comparecendo em mais número nas reuniões e o número de matrículas vem aumento a cada dia.
"Temos uma equipe de professores e funcionários unidos e que estão sendo estimulados a inovar sempre que possível. Com autonomia pedagógica e estratégias criativas estamos criando uma nova era na escola", conta a diretora Marli Stuart.