28/10/2015 18:05:00 » Autor: Marco Antonio Costa / Fotos: Paula Johas
O Hospital Municipal Nossa Senhora do Loreto, na Ilha do Governador, celebra, neste mês de outubro, os 30 anos do Centro de Tratamento de Fissuras Labiopalatais (CEFIL-HMNSLoreto). Um dos maiores centros de referência do Brasil no tratamento de crianças nascidas com fissuras labiais ou palatais (no céu da boca), o serviço oferece pelo SUS acompanhamento integral, desde a saída da maternidade até o final da adolescência, com tratamento cirúrgico, de ortodontia (aparelho), fonoaudiologia, psicologia, entre outras especialidades. Por ano, são realizadas em torno de 500 cirurgias em pacientes com essas patologias.
A criança que nasce com fenda palatal não consegue sugar, fato que compromete totalmente a alimentação do bebê e, consequentemente, sua sobrevivência. Já na maternidade, não só do Rio, mas como em qualquer parte do estado, a família é orientada a procurar o CEFIL, onde o serviço de assistência social agiliza a primeira consulta. Conforme explica a doutora Ana Cláudia de Oliveira Cruz, coordenadora do setor, muitas vezes as famílias não sabem como lidar com o problema, desconhecendo completamente a má formação labiopalatal.
Esse foi o caso de Tainá Costa Arruda, 16 anos, mãe de Thuany de seis meses. Ela mora em Belford Roxo e leva a filha uma vez por semana ao CEFIL, acompanhada da irmã, Raiane Costa Arruda, de 21 anos.
- Minha filha nasceu no Hospital Moacir do Carmo, em Belford Roxo. Quando soube do problema não sabia o que fazer. Mandaram que minha irmã Raiane me trouxesse aqui com minha filha. Foi a nossa salvação, pois nos deram tudo o que precisávamos. Logo foi colocada uma prótese na boquinha da Thuany, que não conseguia fazer a sucção e agora já usa a mamadeira normalmente. Hoje ela está muito bem de saúde. Se não fosse esse tratamento minha filha não iria resistir.
O início precoce do tratamento, já nos primeiros dias de vida, é fundamental, de acordo com os especialistas. O recém-nascido recebe no CEFIL-HMNS Loreto uma prótese e passa a ser acompanhado por uma equipe multidisciplinar, no serviço de Acolhimento Mãe-Bebê. Em geral, o paciente passa por uma série de cirurgias, sendo a primeira realizada entre o 5º e 6º mês (a criança precisa ter no mínimo de 6 kg), aumentando a chance de sucesso e evitando que a criança cresça com traumas por causa do problema. Depois da cirurgia de correção, o paciente tem acompanhamento permanente ambulatorial e cirúrgico até os 17 anos. Acima dessa faixa etária, permanece com acompanhamento ambulatorial e dentário.
Do total de pacientes do CEFIL-HMNS Loreto, 50% são de outros municípios. O hospital atende também usuários de outros estados e até de outros países. A cada mês, em média de 17 novos pacientes são inscritos na unidade. O ambulatório realiza aproximadamente 10 mil consultas odontológicas por ano, atendendo desde recém-nascidos para a colocação da placa obturadora até pacientes na fase adulta jovem, com a realização de implantes, enxertos e cirurgias ortognáticas, um atendimento de alta complexidade.
- É um trabalho que nos exige muita dedicação, mas somos compensados por recuperar praticamente 100% das crianças. Temos casos como a mãe que abandonou o tratamento do filho voltando só três anos depois. Ainda assim conseguimos reabilitar o menino, que se chamava Gabriel. A minha maior alegria é ver a criança voltar a sorrir. Quando ainda é um bebê vemos o sorriso no olhar. É uma coisa que não tem preço – confidenciou a doutora Ana Cláudia.
A doutora Luciene Simões, há 17 anos no hospital, especializada na colocação de prótese obturadora, destaca a organização da equipe especializada do hospital. O atendimento odontológico, por exemplo, é feito no ambulatório, de segunda a sexta-feira, devendo ser previamente agendado no próprio setor e é exclusivo para pacientes com fissuras labiopalatais, sem limite de idade. A exceção é feita para bebês recém-nascidos, os quais têm prioridade no atendimento, não sendo necessário marcar consulta.
Após atender Thuany, doutora Luciene preparava-se para atender Enzo Gabriel, que completou um ano de vida e recebe acompanhamento do CEFIL desde o terceiro dia de nascido. O caso dele era dos mais delicados - nasceu com fissura de palato mole, contou a doutora - , e precisou ficar internado após a colocação da prótese para aprender a sugar.
- Ele nasceu no Hospital Rocha Faria, em Campo Grande, mas morávamos em Pedra de Guaratiba. Fomos encaminhados para cá e desde o primeiro momento fomos muito bem acolhidos. Não sabíamos, eu e o pai, o que era isso. Lembro-me que a doutora Luciene foi um anjo, me acalmando e explicando tudo. O tratamento é longo e passa por diversas etapas. Mudamos para o Alto da Boa Vista e está dando tudo certo. Estou tranquila, é como se fossemos uma família – revelou Patrícia Gomes da Silva, de 20 anos.
O Centro de Tratamento de Fissuras Labiopalatais oferece apoio psicológico para os pais das crianças, além de serviços sociais para os mais carentes. O atendimento vai de zero até os 18 anos de idade. A partir dos cinco anos as crianças já podem participar do coral organizado pelo hospital. A iniciativa tem o objetivo de sociabilizar os pacientes, que cantam em hospitais e em festas de estabelecimentos de ensino. Como diz a diretora do Loreto, Fátima Regina Almeida Brandão, cria-se um vínculo paciente/família/hospital de muito amor.
- Mesmo após a finalização do tratamento, com o jovem já com seus 18 anos de idade, o laço não se desfaz.
Tipos de patologia:
Fissura Labial: Deformidade que pode abranger o lábio, a arcada alveolar e o nariz. A cirurgia é realizada em torno dos seis meses de vida, abordando também o nariz. Normalmente é realizada um única cirurgia, salvo os pequenos retoques que se façam necessários. Em caso de fissuras bilaterais , pode ser necessário mais de um tempo cirúrgico.
Fissura palatina: Abrange parte ou todo o palato (céu da boca). A musculatura palatina está dividida e sua função está comprometida (alimentação, fonação). A cirurgia é feita a partir dos doze meses, necessitando do acompanhamento da fonoaudiologia e da ortodontia. É de suma importância que o procedimento cirúrgico, assim como todo o acompanhamento fonoaudiológico e ortodôntico, seja feito por pessoal especializado.
Fissura Labiopalatina: É a associação das duas patologias acima descritas, isto é, abrange lábio e palato.
Números no CEFIL:
A fonoaudiologia realiza cerca de 3.600 consultas/ano no CEFIL. A equipe multidisciplinar também conta com os atendimentos clínicos da cirurgia plástica (2.300/ano), pediatria (3.800/ano), nutrição (1.700/ano), terapia ocupacional (1.700/ano) e psicologia (1.700/ano).